terça-feira, 27 de março de 2007

"Confissões"


"(...) Tinha também, ao mesmo tempo, uma paixão violenta pelos espectáculos do Teatro, que estavam cheios das imagens das minhas misérias, e das chamas amorosas que alimentavam o fogo que me devorava. Mas qual o motivo que faz com que os homens acorram com tanto ardor, e que queiram experimentar a tristeza olhando coisas funestas e trágicas que, apesar de tudo, não quereriam saber? Porque os espectadores querem sentir a dor, e dessa dor o seu prazer? (...) Mas que compaixão se pode ter para com as coisas fingidas e representadas num Teatro, uma vez que não se excita o auditor para socorrer os fracos e oprimidos, mas sim este convidado que se aflige com o seu infortúnio? Que ele fica tanto mais satisfeito com os actores quanto mais eles o comoveram com pena e aflição; e que, se estes sujeitos trágicos, com as suas infelicidades verdadeiras ou supostas, são representados com tão pouca graça e indústria que não o afligem, sai desgostado e irritado com os actores. Que se, pelo contrário, for tocado com a dor, fica atento e chora, experimentando, ao mesmo tempo, o prazer e as lágrimas. Mas dado que todos os homens naturalmente desejam alegrar-se, como podem gostar dessas lágrimas e dessas dores? Não será que, ainda que o homem não sinta prazer pela miséria, no entanto ele sinta prazer a ser tocado pela misericórdia: e que, dado que não pode experimentar esse movimento da alma sem experimentar a dor, acontecerá que, por uma consequência necessária, ele acarinhe e goste dessas dores? (...)"

Confissões, Santo Agostinho (400 d.C.)


Em homenagem a uma das mais belas formas de arte da Humanidade.

27 de Março - Dia Mundial do Teatro

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